A vida é um mingau, com sabor de milho verde e canela pulverizada por cima.
Daqueles deliciosos que a mamãe fazia nas noites de frio, substituindo o jantar, ou então no lanche da tarde, com cereal e banana cortada por cima, como nos comerciais de tevê.
A gente come pelas beiradas, coloca bocadinhos na boca pequena e que logo se torna grande, pois o mingau está quente e a mamãe avisou para ter cuidado.
Às vezes está mais ralo, muito doce; é de milho, é de maisena, é de flocos de cereais. Tem dias em que é salgado, a gente estranha o primeiro, mas logo se acostuma.
Mingau não precisa mastigar. Por isso mesmo, seu sabor chega com mais facilidade às papilas, espalha-se, aquece a alma.
Mingau tem sabor das tardes em que pulávamos de dor durante o banho, pelos joelhos escalavrados após os tombos dos carrinhos de rolemã, dos papelões rasgados na descida do morro gramado, dos muros pulados e das expedições - geralmente não autorizadas - às goiabeiras dos vizinhos. Do tempo em que só reclamávamos por ir à escola, e reclamávamos mais ainda por não querermos ir no dia de nosso aniversário.
Mingau tem sabor de pipa ao vento, de aviãozinho de lata, de cuidado de criança com passarinho que quebrou a asa.
Mingau é a inocência em alimento, tem sabor de infância, de saudade; da paz e da doçura que só as crianças sabem ter quando olham para o mundo e acham que já são grandes.
Não só para as crianças é feito o mingau. Também o é para os muito idosos, que já perderam os dentes e a senilidade os abençoaram com a inocência das crianças.
ResponderExcluirTambém serve para nós, meros e estúpidos adultos, nos relembrarmos dos tempos de infância e, num lampejo de lucidez, lembrarmos do que é efetivamente importante para nós.
Seu mingau é como o Ratatui do filme, que faz o crítico se lembrar da comida da mãe.
E, no fundo, mingau não é só de mãe: é de qualquer um que o faz com carinho para alguém que ama.
Beijo mingalado.