quarta-feira, 10 de março de 2010

Aline

Ele me procurava incessantemente, com aquela carinha de menino tímido e aquele sorrisinho de canto de boca que derrete qualquer mulher. Parado do outro lado da avenida, sob a luz da Lua, contemplava meu corpo e o meu rosto etéreo. Fiz um sinal com a mão, chamando-o, e ele veio. Bastou isso para que ele chegasse bem perto, de forma que pude sentir seu perfume misturado ao suor da corrida.

Puxei-o pela mão e seguimos para uma boate. Eu queria dançar até me acabar. As luzes ritmadas, a fumaça do gelo seco, tudo me deixava feliz. Girava na pista e, num joguinho gostoso, deixava com que meu cabelo se esvoaçasse e batesse de leve no rosto dele. Toquei-lhe as mãos e pedi para comigo dançar, para que eu pudesse, enfim, sentir seu inebriante perfume mais de perto. Convidei-o para dar uma volta, tomar um ar. Ele quis pegar o carro, mas não deixei, preferia ir a pé. O som de The 69 Eyes, então, foi ficando longe enquanto caminhávamos.

Por um momento parei, e contemplei o seu rosto. Encostei-o num poste e beijei-o sofregamente, queria mostrar-lhe tudo o que eu queria, que me inundasse com seu desejo. Deslizei minhas unhas cor de sangue por seu pescoço e passei por seu corpo ainda suado da dança. Desci-lhe o zíper da calça e o beijei. Provoquei. Fiz tudo o que sabia que ele gostava, olhando no fundo de seus olhos. Queria vê-lo com a respiração ofegante, com o cheiro da paixão transpassando todos os poros. Era perfeito, eu fogosa e ele hipnotizado.

Ele se perdeu em meu gesto de carinho e finalmente esqueceu-se de que estava na rua. E como era belo, como me tentava! Meus movimentos iam ficando cada vez mais fortes, e o que eu queria mesmo era que ele fizesse amor comigo ali mesmo. Ele me procurava tão incessantemente, e eu queria e podia dar a ele o melhor que já tivera. E podia responder-lhe à altura.

Toquei seus cabelos na nuca, e pedi-lhe, sem palavras, que me desse o melhor sexo que já dera a alguém. Ele soube ler meus olhos, meus lábios e meus dedos. Com sua delicadeza, levantou meu vestido e afastou minha pequena calcinha lilás, escolhida especialmente para ele. Apoiei-me no poste, de costas para ele, e pedi que me penetrasse. Sussurrei e gemi baixinho a cada movimento, e arrepiava a cada vez que ele me puxava para perto de seu corpo.

Quando terminamos, senti que quem me contemplava agora era ele, num misto de ternura e inocência. Eu sabia que o tinha encantado.

À aurora eu precisava me despedir. Sentia pesar em deixá-lo, mas preparei-lhe todo o caminho, sabia que ele ficaria feliz por tudo que eu fizera. Preferi deixá-lo sozinho quando ele me disse algumas doces palavras, dei-lhe um beijo e não quis que ele me acompanhasse até a saída.

Também não deixei com que ele percebesse que no momento em que o chamei do outro lado da avenida um baque surdo se fez ouvir. Seu corpo fora abalroado e atirado a metros de distância por um veículo sob o comando de um ébrio. Ele se olhava no ataúde, e eu não quis saber se ele se achava bonito ali, apenas quis despedir-me com um terno beijo. E assim fiz.

Meus olhos se encheram de lágrimas. Ele chamou meu sorriso de "Aline".

* Baseado no conto "Teu sorriso se chama Aline", de M. D. Amado.

2 comentários:

  1. Muito bom... O ponto de vista de Aline sobre os fatos. Excelente. Adorei!

    Obrigado pela homenagem! :-)

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  2. Não conheço o texto original, mas o seu é bem excitante, bem, ao menos antes do anti-clímax...

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