domingo, 3 de janeiro de 2010

Tortura

O casal ria e conversava animadamente. Estavam no apartamento da irmã da esposa, comemorando o aniversário do cunhado.

Todos comeram e beberam muito e, por isso, a irmã não os deixou voltarem para casa, e ofereceu-lhes um quarto para passarem a noite. Fora realmente uma decisão acertada, pois o esposo não estava com o menor reflexo, especialmente para pilotar uma motocicleta. O cunhado o ajudou a guardá-la na garagem e novamente subiram ao apartamento.

A irmã preparou-lhes a cama de que dispunha: estendeu um lençol num colchão de solteiro que colocou no chão, pôs ao lado um edredon e dois travesseiros macios. Como a porta era de vidro, tomou o cuidado de cobri-la para que, caso o fogo do álcool se transformasse em "fogo na roupa", os dois tivessem a privacidade respeitada. A irmã e o cunhado despediram-se e foram dormir.

O casal ajoelha-se no colchão para tirarem as roupas, que cheiravam a cigarro. Mal se olharam e o desejo provocou-lhes. Beijaram-se ardorosamente, e fizeram amor como nunca, tomando o cuidado de sufocarem seus gritos de prazer com os macios travesseiros que a irmã lhes emprestara. Adormeceram.

Lá pelas três da manhã, a esposa acorda incomodada com as reações de seu intestino à quantidade de gordura consumida. Tentava levantar-se para ir ao banheiro e, nesse instante, o esposo acordou. Ele a abraçava e não a deixava se levantar, querendo outra sessão de amor. A esposa, irritada, falou que não queria mais, porque estava passando mal, e o esposo ficou transtornado. Começou então a torturá-la, beliscando-a e dizendo que não gritasse. Falava que ela o usara para ir à casa da irmã e que se era para fazer desse jeito, que não o chamasse mais, que ela poderia muito bem ir de ônibus. Puxava-lhe os cabelos e sufocava seus gritos com o travesseiro, apertava-lhe os mamilos, mordia-lhe os braços.

A esposa tentava justificar-se, dizendo que o amava, mas que de toda forma seria impossível fazerem amor com ela passando mal, que não o havia usado, não havia necessidade daquilo, já que ambos dispunham de carro e ela tinha habilitação. Cada vez mais sofrendo com a tortura, seu choro transformara-se num fio de voz, pedindo pelo amor de Deus para que o marido parasse.

Ao que parece, Deus ouviu suas preces, e ele levantou-se para urinar. Ao chegar ao banheiro, estranhou uma certa quantidade de esperma ressequido em sua virilha, mas ainda assim voltou para torturar a esposa. Mais cobranças, mais tortura... por fim, ela, percebendo que ele, por estar bêbado, não se lembrava do amor que haviam feito, diz, desesperada, somente articulando as consoantes:

- Me cheiraaaaa! Me cheiraaaaaaaaaa!

Ele não cheirou, mas conseguiu ligar o que a esposa pedia ao fato de ter encontrado o esperma em sua virilha. Seus olhos claros tornaram-se negros, tamanha fora a dilatação de suas pupilas. Pediu perdão de todas as formas a ela, que chorava compulsivamente sobre os travesseiros. Arrependido, acolheu-se num canto e lá permaneceu até o amanhecer. A esposa adormeceu.

De manhã, novamente pediu perdão à esposa e quis deitar-se ao seu lado. Ela consentiu e, com o abraço, ele teve vontade de amá-la de novo. A contragosto, permitiu que a penetrasse, sentindo-se uma prostituta por estar sujeitando-se àquele estupro da alma. Vestiram-se, tomaram café com a irmã e o cunhado e voltaram para casa.

Mais tarde, enquanto ela preparava calada o almoço, o marido não parava de lhe pedir perdão pelo que lhe fizera durante a madrugada. Ela o serviu e almoçaram em silêncio. Enquanto comia, sua visão se turvava, e não sabia se era pelas lágrimas. Também sentiu calafrios e um revertério no estômago. Dizia à esposa:

- Querida, eu quero morrer pelo que fiz a você! Me perdoe!

Ela, sem proferir uma palavra, apenas olhava sorrindo para o tubo de chumbinho em cima da pia.

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