sábado, 29 de janeiro de 2011

Vermelho e branco

Ovo de gema mole, suco de abacaxi, pão, café, chá. Ele preparou tudo só para ela, com a ansiedade de uma criança na manhã do dia de Natal. A mesa posta com xícaras de louça e talheres, a toalha vermelha e branca xadrez, o guardanapo também vermelho, dobrado em pentágono, combinando.

Ele já havia chamado um táxi para levá-la ao aeroporto, em determinado horário, para que pudessem ficar um pouco mais de tempo juntos. Cada minuto era precioso e cada carinho especial. Assim que ele planejara tudo para que fosse inesquecível, cada gesto, cada passo, cada palavra. Com ele, ela estava ali, bem perto do céu, e uma bandeira vermelha e branca tremulando dizia a ela: "aqui você está segura". Tinha o sol nas mãos.

Foi uma semana intensa, de delícias de lugares, delícias gastronômicas, abraços e beijos. Por todo o tempo em que estiveram juntos, não fizeram mais do que aproveitar ao máximo a companhia um do outro. O café da manhã, tão especial, não só tinha sabor intenso de café, como também sabor de sentimentos brancos. Alegria, paz, sensação de dever cumprido, serenidade. Mas ainda viria algo mais.

Veio então o táxi, e com ele o medo e a sensação de vazio. O motorista desceu, os cumprimentou, começou a carregar os pertences dela e colocá-los no porta-malas. Entrou de volta no carro e esperou que se despedissem. As mãos dos dois, então, que se tocavam todo o tempo, foram se transformando aos poucos em um forte e doce abraço. Como uma xícara de café.

Longa e ternamente ficaram naquele abraço apertado e já cheio de saudade. Os dois tinham os óculos postos na cabeça, mas ele, sorrindo, baixou o seu primeiro. Por baixo da lente avermelhada, ela viu um discreto marejar em seus olhos. Foi aquele olhar que guardou consigo e que a fez também baixar seus óculos, a fim de ocultar o que ja era bastante visível. Sentimentos vermelhos. Paixão. Voracidade. Desejo. Ira. Vontade de chutar tudo para cima e ficar. Foi se afastando até ver a imagem de sua camiseta vermelha e branca refletida nos óculos dele. Entrou no carro e fechou a porta. Não conseguiu falar mais.

Até Callao foi um longo caminho. Um caminho que ela percorreu com um lenço na mão. Sabia que, quando ia a algum lugar, sempre deixava um pedaço de si. Desta vez, o que deixara ali fora seu coração.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Prosa moderna III

- Então tá. Um beijo.

- Ah, é? Só um beijo? Mas onde?

- Eu já te dei o beijo. É seu. Pode escolher.